Sobre a incapacidade para a poesia

Por Adriana Bernardes

Brasília, 12 de maio de 2020. Hoje acordei com uma vontade danada de escrever um poema! Foi a primeira coisa que me veio a cabeça quando abri os olhos. Certamente ele teria a palavra arrebatada. Gosto dela e do que ela define. 

Produzi mentalmente algumas frases. Em pouco tempo me dei conta da minha total incapacidade para tirar da cachola um poema. Meu dia, porém, necessita de poesia. E só consigo pensar em Para além da curva da estrada, apresentado a mim pela Ceiça. A busca pelo nome do autor me levou a uma descoberta incrível! 


Para além da curva da estrada





Para além da curva da estrada

Talvez haja um poço, e talvez um castelo,

E talvez apenas a continuação da estrada.

Não sei nem pergunto.

Enquanto vou na estrada antes da curva

Só olho para a estrada antes da curva,

Porque não posso ver senão a estrada antes da curva.

De nada me serviria estar olhando para outro lado

E para aquilo que não vejo.

Importemo-nos apenas com o lugar onde estamos.

Há beleza bastante em estar aqui e não noutra parte qualquer.

Se há alguém para além da curva da estrada,

Esses que se preocupem com o que há para além da curva da estrada.

Essa é que é a estrada para eles.

Se nós tivermos que chegar lá, quando lá chegarmos saberemos.

Por ora só sabemos que lá não estamos.

Aqui há só a estrada antes da curva, e antes da curva

Há a estrada sem curva nenhuma.


Quis saber quem teve a capacidade de escrever algo tão profundo e simples, tão atemporal, tão verdadeiro. Algo que serve pra qualquer um, seja qual for o momento de vida. Então fui pesquisar.

O google me contou que o autor é Alberto Caeiro, um dos heterónimos de Fernando Pessoa. Não sabia o que é heterónimo, só pseudônimo. Apesar ter um enorme apreço por Pessoa desde sempre, só soube hoje cedinho, que o danado do português criou três heterónimos, três poetas dentro do poeta, três pessoas únicas. Quanta genialidade! 


(Não) diário de um dia qualquer, de um isolamento social forçado por uma pandemia

Comentários

  1. Adoro Alberto Caeiro, Alvaro de Campos, André Reis e até Fernando Pessoa.....respiro com poesia e quando um pássaro assovia. Obrigada

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  2. Obrigada a você querida! De canto em canto, superamos o desencanto! Beijo grande Fernanda.

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